FETRAF-SC alerta que estiagem e cigarrinha-do-milho podem excluir Agricultores Familiares, caso o Governo continue sem ação
Toda a cadeia de produção de leite em Santa Catarina passa, neste momento, por um abalo causado por duas quebras consecutivas na safra de milho em função do clima, além de uma praga que está assolando a produção. O problema deve ser sentido no início do inverno, segundo avaliação da FETRAF-SC (Federação dos Trabalhadores e Trabalhadoras na Agricultura Familiar de Santa Catarina).
Com a estiagem recorrente, que vem castigando a Agricultura Familiar desde o ano passado, agora, a cigarrinha-do-milho traz ainda mais estragos na cultura do milho, tanto para silagem, como para grãos, o que muito em breve causará impacto na cadeia produtiva do leite, já que o milho é um dos principais componentes na alimentação dos animais.
O panorama da situação
A agricultora familiar que produz leite em Dionísio Cerqueira, Monica Fantinel Kuhn, resume bem as dificuldades que o setor vem enfrentando: “ano passado, pensávamos que teríamos pastagem para diminuir o custo com silagem e com ração, mas aconteceu a seca. Tivemos que gastar praticamente toda a silagem que tratamos e, quando chegamos em outubro, não tinha mais. Como não tínhamos milho, porque o solo estava muito seco e duro para plantar, tivemos que comprar silagem de fora e isso aumentou o custo da produção”.
Ela conta que, este ano, a estiagem devastou novamente a lavoura, por isso, o grão nasceu desparelho, “o milho ficou todo em palha e não rendeu a silagem, e agora ainda tem a cigarrinha”, acrescenta a agricultora.
José Giacomin, agricultor familiar de Galvão, também está preocupado com a praga. “A cigarrinha atacou a maioria das lavouras da nossa região. O milho não enraíza e não consegue produzir a espiga, e isso vai dar um prejuízo imenso”. Veja o vídeo que José compartilhou nas redes:
Para o coordenador geral da FETRAF-SC, Jandir Selzler, a situação que se encontram os agricultores familiares que produzem leite em SC não deixa dúvidas sobre a forte crise que se aproxima, “em São Lourenço do Oeste, por exemplo, entidades da Agricultura Familiar fizeram um levantamento e identificaram que 100% das propriedades dos seus associados apresentam sérias perdas na produção do milho”.
Nessas propriedades, segundo o coordenador, o prejuízo chega a 60%.
Os impactos da crise na cadeia do leite
Segundo a FETRAF-SC, as consequências desse prejuízo já são graves, mas serão ainda piores, “muito provavelmente vão faltar insumos para os animais no inverno e os agricultores vão ser obrigados a comprar de fora, o que aumenta consideravelmente o custo da produção”.
Atualmente, o consumo de milho anual em Santa Catarina passa de 7 milhões de toneladas, o que está muito longe de ser suprido pela produção no Estado, que produz uma média de 2,7 milhões de toneladas. “Já estávamos dependentes dessa matéria-prima e agora a situação vai ficar ainda mais crítica, porque já tivemos uma quebra de 1 milhão de tonelada na produção. Como vai ficar a produção de aves e suínos sem esse insumo?”, questiona a Federação.
Por outro lado, concomitante ao aumento no custo da produção, a FETRAF alerta para a entrada indiscriminada de leite no Brasil, principalmente da Argentina e do Uruguai, o que faz o preço pago aos agricultores familiares despencar.
“Com o aumento no custo de produção e sem condições de competir com o preço do leite que vem de fora, a nossa bacia leiteira vai quebrar, porque os nossos agricultores não vão conseguir honrar os financiamentos feitos para investir na produção e ainda garantir a sua subsistência” – FETRAF-SC
Ação lenta do Governo
O governo de Santa Catarina afirma que está ajudando a Agricultura Familiar, intermediando as negociações com o governo Federal para prorrogar o prazo dos financiamentos dos agricultores, mas a FETRAF defende que as ações do Estado devam ser mais rápidas e efetivas.
A entidade reclama do atraso da Secretaria de Estado da Agricultura em liberar R$ 5 milhões captados do Fundo de Desenvolvimento Rural (FDR) para auxiliar agricultores que sofreram com a estiagem ainda em 2020.
O governo do Estado anunciou a liberação de R$ 50 mil por município no dia 04 de dezembro de 2020 com a intenção de auxiliar 90 municípios que decretaram emergência ou calamidade no ano passado, em função da seca. Até o dia 31 de março, nenhum município havia recebido o recurso.
Soluções para amenizar o colapso
Para a FETRAF-SC, essa crise na cadeia do leite também é resultado de uma cadeia de produção leiteira defasada e insustentável. “É preciso rever esse modelo que além de excluir muitas famílias, há muito tempo vem se mostrando inviável, porque estamos sempre vulneráveis e dependentes de matéria-prima“, avalia Selzler, referindo-se ao modelo de produção de leite à base de pasto.
Em curto prazo, a Federação aponta uma série de medidas para amenizar o impacto da crise, a começar por um diálogo com o Companhia Nacional de Abastecimento (Conab) para que não apenas regule o preço do milho, mas que também disponibilize seu estoque com a precificação mínima aos agricultores familiares atingidos por essas crises sucessivas.
Preocupado com a entrada de leite estrangeiro no país, o coordenador pontua que o Mercosul não impede que haja acordos, “precisamos de diplomacia e vontade política para valorizar o leite nacional”.
Ainda no âmbito Federal, a entidade participa de negociações para anistiar ou, pelo menos, prorrogar as dívidas dos trabalhadores do campo.
Com o governo do Estado, a FETRAF pretende negociar a prorrogação dos vencimentos do Programa Troca-troca deste ano, além de pedir a sua ampliação, para que os agricultores familiares possam ter acesso a variedades e maior volume de sementes e insumos, “também pedimos que o Estado entre com um subsídio e financie sementes de pastagem de inverno. É preciso agir logo, ou a nossa Agricultura Familiar não vai aguentar o rojão”.
Comunicação FETRAF-SC